Postado por Charlston Ricardo,
advogado e membro da Comissão de Defesa do Consumidor da OAB/PE
A restituição do VRG (Valor
Residual Garantido) à luz do STJ - Superior Tribunal de Justiça: os cuidados
para evitar o enriquecimento sem causa por parte do fornecedor no caso de
rescisão do contrato de arrendamento mercantil ou leasing.
Nos
termos da matéria abaixo, o STJ divulgou notícia comunicando que consolidou o
entendimento sobre a restituição ou não do VRG no caso de inadimplemento no
contrato de leasing. A notícia é extraída do julgamento do REsp 1099212, que
foi julgado em recurso repetitivo, cuja lide foi judicializada em ação de
reintegração de posse.
É cediço
que o contrato de leasing é um contrato de arrendamento mercantil, a teor do
Art. 1º, da Lei 6.099/74.
Desta
feita, constata-se que o arrendamento mercantil nada mais é do que o
arrendamento de bens. E o arrendamento de bens é "simplesmente" a
locação de bens por um determinado prazo a um preço determinado, conforme está
definido por De Plácido e Silva, na sua obra intitulada de o Vocabulário
Jurídico e, por Aurélio, no Dicionário Aurélio, veja:
“LEASING”.
Ou arrendamento mercantil, é o contrato segundo o qual uma pessoa jurídica
arrenda a uma pessoa física ou jurídica, por tempo determinado, um bem comprado
pela primeira de acordo com as indicações da segunda, cabendo ao arrendatário a
opção de adquirir o bem arrendado findo o contrato, mediante preço residual
previamente fixado (Fran Martins). (in Vocabulário Jurídico / atualizadores:
Nagib Slaibi Filho e Gláucia Carvalho. Forense. Rio de Janeiro, 2005)
arrendamento
[De
arrendar1 + -mento.]
Substantivo
masculino.
1.Ato ou
efeito de arrendar1.
2.Aluguel
ou contrato pelo qual alguém cede a outrem, por certo tempo e preço, o uso e
gozo de coisa não fungível (geralmente imóveis).
3.Instrumento
desse contrato.
4.Preço
estipulado para fruição da coisa arrendada. [Sin. ger. (p. us.): arrendação.]
Arrendamento
mercantil. 1. Econ. Operação entre pessoas jurídicas pela qual uma delas cede o
uso de um ou mais bens (como veículos, máquinas, equipamentos, etc.) mediante o
pagamento pela outra de prestações periódicas, sendo usual que ao fim do
contrato o arrendatário tenha opção de compra dos bens. [Sin. (ingl.):
leasing.] (Novo Dicionário Eletrônico
Aurélio versão 5.0 © O Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa corresponde
à 3ª. edição, 1ª. impressão da Editora Positivo, revista e atualizada do
Aurélio Século XXI, O Dicionário da Língua Portuguesa, contendo 435 mil
verbetes, locuções e definições. Edição eletrônica autorizada à POSITIVO
INFORMÁTICA LTDA)
Corroborando
com o acima suscitado é o entendimento doutrinário sobre a questão, veja o que
diz Aramy Dornelles da Luz, quando define a figura jurídica do arrendamento
mercantil:
O
arrendamento mercantil, também denominado leasing, é, em linhas gerais, um
negócio jurídico de financiamento, que toma a forma de uma locação de bens
móveis ou imóveis, onde o locador atribuí ao locatário o direito de opção entre
renovar a locação, devolver o bem ou comprá-lo, pagando então apenas o valor
residual nele previsto, findo o prazo contratual. (in "Negócios Jurídicos Bancários - 0
Banco Múltiplo e seus Contratos", RT, p. 194)
Nos
termos do Art. 5º da Lei 6.099/74 o arrendatário (o consumidor) poderá optar
pela aquisição da compra do bem arrendado ao término do contrato de leasing.
Contudo,
na prática, em regra, essa opção é imposta ao arrendatário, que ao aderir ao
dito contrato já encontra no contrato de adesão de arrendamento a opção de
compra preestabelecida, com o que seria o valor de compra distribuído em
parcelas denominadas de VRG – Valor Residual Garantido.
Desta
feita, no contrato de arrendamento mercantil, como regra, há a cobrança da
contraprestação pelo uso (locação) do bem e do VRG (que corresponde ao
parcelamento do valor de compra do bem, acaso o arrendatário optasse ao término
do termo por adquiri-lo).
Ocorre
que às vezes o arrendatário entra em mora ou torna-se inadimplente com a
obrigação, deixando de pagar a contraprestação e o VRG, que são cobrados, em
regra, mensalmente, por meio de parcela única, ou seja, de parcela que
compreende o valor da contraprestação e o VRG. E isso permite que o arrendador
promova ação de reintegração de posse, já que o bem arrendado é de sua
propriedade (evidenciando o nítido contrato de locação).
Afora o
problema da imposição ao consumidor do VRG antecipado, quando da reintegração
de posse surge um problema acerca do valor que foi pago antecipadamente a
título de preço final de compra, ou seja, do VRG, especificamente, se havendo a
reintegração do bem, o VRG deveria ou não ser devolvido ao consumidor, já que
ele não adquirirá mais o mesmo, ante a rescisão que se instaurou com a
reintegração de posse, e pelo fato dele ter realizado mensalmente, enquanto
vigente o contrato, a contraprestação pelo uso do bem arrendado.
É
importante atentar que o VRG só é pago porque, em tese, houve a opção
antecipada de compra por parte do consumidor. Embora não se possa esquecer que
essa opção é imposta no contrato de adesão.
O STJ, em
recurso repetitivo, acima apontado, objetivando pacificar o entendimento
jurisprudencial, firmou o entendimento de que o VRG só será devolvido ao
consumidor se após a alienação do bem arrendado - o que ocorre após a
reintegração - o valor da alienação for suficiente para quitar o valor da
operação, que, ao que tudo indica, é o valor do contrato. Ante a decisão em
tela, também poderá ocorrer a restituição se a soma do valor da alienação e do
VRG pago ultrapassar o valor do negócio.
Segundo o
ministro Villas Bôas Cueva, relator para o acórdão do feito indicado, nos
termos da notícia do STJ, a postura expressa na decisão visa garantir o
equilíbrio econômico-financeiro, “preservando-se os princípios da boa-fé e da
função social do contrato. ‘Tudo a bem da construção de uma sociedade em que
vigore a livre iniciativa, mas com justiça social’”.
Todavia,
para que os princípios acima sejam realmente preservados, é preciso atentar que
o VRG, ou seja, o preço de compra final, é pago antecipadamente pelo
consumidor, o que obriga ao arrendador atualizar esse valor no momento da
rescisão contratual. Outrossim, por razão lógica, é necessário que seja
expurgado da operação, ou seja, do contrato de leasing, qualquer cobrança de
encargos sobre o VRG, já que esse valor só seria exigível ao final do contrato
e o consumidor acaba pagando de forma antecipada, e o pior, como se um valor
financiado fosse, com acréscimos de juros e outros encargos decorrentes de um
financiamento.
Portanto,
no momento de se averiguar se haverá a restituição do VRG ao consumidor, ou se
o VRG pago servirá para quitar a operação, o arrendador deverá atualizar as
parcelas pagas a título de VRG com os mesmos encargos aplicados no contrato
para a parcela correspondente a contraprestação pelo uso e, além disso, deverá
expurgar do contrato qualquer encargo cobrado antecipadamente pelo preço de
venda, ou seja, deverá excluir do valor da operação a cobrança de juros e
correção monetária impostas no VRG, já que, na prática, o arrendador ainda faz
incidir juros e outros encargos sobre a parcela do VRG, como se o arrendamento
fosse um financiamento ou um contrato de compra e venda a prazo sob
financiamento.
Desta
feita, partindo do princípio que o VRG deveria ser devolvido ao consumidor, já
que o negócio foi rescindido e ele não mais adquirirá o bem, antes de se
autorizar a compensação desse valor com o valor da operação, é preciso
atualizar todas as parcelas do VRG e expurgar qualquer encargo imposto pelo
fornecedor, isto é, pelo arrendador, sobre essa parcela na operação, sob pena
de se permitir o enriquecimento sem causa do arrendador.
Abaixo
segue a notícia divulgada pelo STJ:
RECURSO
REPETITIVO
STJ
consolida tese sobre devolução do VGR nos casos de inadimplemento de contrato
de leasing financeiro
“Nas
ações de reintegração de posse motivadas por inadimplemento de arrendamento
mercantil financeiro, quando o produto da soma do valor residual garantido
(VRG) quitado com o valor da venda do bem for maior que o total pactuado como
VRG na contratação, será direito do arrendatário receber a diferença, cabendo,
porém, se estipulado no contrato, o prévio desconto de outras despesas ou
encargos contratuais.”
A
decisão, firmada em recurso repetitivo (artigo 543-C do Código de Processo
Civil), é da Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça. O julgado acabou
por definir o entendimento a respeito do tema, que se mostrava, até certo
ponto, conflituoso na Corte.
O
caso
No
caso analisado pelo STJ, uma empresa de leasing propôs ação de reintegração de
posse alegando que firmou contrato de arrendamento mercantil de produtos de
informática com antecipação do valor residual garantido (VRG), encontrando-se o
réu em inadimplência. O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) manteve a
sentença que julgou procedente o pedido para reintegrar a empresa na posse
plena dos bens.
No
STJ, o recurso especial do réu foi afetado como repetitivo. A controvérsia
estava em definir se, com a reintegração de posse do bem arrendado pelo
arrendador, a quantia paga antecipadamente a título de valor residual garantido
deveria ser restituída ou compensada com seu débito.
Após
o voto do ministro relator dando parcial provimento ao recurso, o ministro
Ricardo Villas Bôas Cueva, em voto-vista, divergiu. Para ele, “é ínsita à
racionalidade econômica do leasing financeiro a preservação de um valor mínimo
em favor do arrendador pelo produto financiado, a servir-lhe de garantia (daí o
nome: valor residual garantido), a depender, no caso de não exercida a opção de
compra pelo arrendatário, do valor recebido com a venda do produto”.
Função
social
Segundo o
ministro Villas Bôas Cueva, relator para o acórdão, no caso de inadimplemento,
havendo a devolução do produto, o bem será retomado à posse do arrendador, que,
se for o caso, o venderá no mercado conforme o preço praticado, buscando a
liquidação do saldo devedor da operação.
Se
o resultado da venda somado ao VRG eventualmente pago for inferior ao VRG
previsto no contrato, nenhuma devolução será devida ao arrendatário. Por outro
lado, se o produto da venda somado ao que já estiver quitado como VRG diluído
ou antecipado ultrapassar o que estava estabelecido no contrato, o restante
poderá ser restituído ao arrendatário, conforme dispuserem as cláusulas
contratuais.
Para
o ministro, observando-se a real finalidade do VRG, será mantido o equilíbrio
econômico-financeiro, preservando-se os princípios da boa-fé e da função social
do contrato. “Tudo a bem da construção de uma sociedade em que vigore a livre
iniciativa, mas com justiça social’, concluiu.
A
Associação Brasileira das Empresas de Leasing, o Banco Central e a Febraban
atuaram no processo na condição de amicus curiae.
REsp
1099212
Uma clausula, que fazia jus ao direito do consumidor, que seria a opção de adquirir, renovar ou devolver o bem arrendado, mais uma derrota para o consumidor que faz a locação com intenção de compra, sendo que muitas das vezes não consegue cumprir e acaba devolvendo o bem. E no final de tudo perderá o que pagou de contraprestação (aluguel), pois o bem será leiloado com o valor bem inferior ao praticado no mercado, sendo que não há como acompanhar todo o processo, pois os grandes camuflaram toda a negociação e mais uma vez, somos lesados pelos nossos legisladores que ai estão, para julgar para todos e não somente para os poderosos!!!!!!!!!!!!!!!
ResponderExcluir